PT

Nascemos em Ovar na madrugada do primeiro de Maio, numa das regiões em que se acreditava que a transição do mês coincidia com o passeio das bruxas, que em grupo tentariam entrar em todas as casas da terra. A população protegia-se com a sabedoria de mães, avós, bisavós. De geração em geração iam recomendando a prudência: deixar nas entradas de casa ramos de maios, planta temida pelas bruxas. Hoje de manhã saímos à rua com a nossa bandeira e colhemos os poucos ramos que entre a descrença e o esquecimento nos lembram o passeio noturno destas mulheres.  Como se o menosprezo que lhes era dedicado, a mezinha que “mal não fazia”, fosse agora mais afirmação de uma presença do que o rasto de uma perseguição cruel.


A nossa marcha é justa:  exigimos dignidade, mais condições para todxs. 

Mas é também justa porque é apertada, confortável na sua ortodoxia. Por isso juntamos no percurso os ramos de maios e carregamos nas mãos estes dois símbolos. E daqui o nosso nome, maio maio, em repetição, como gritos em protesto. Uma tentativa de unir as nossas vozes imperfeitas, de encontrar companheiros e companheiras, crescendo em força e frustração, e contribuindo para o que desejamos que seja uma militância heterodoxa. 


Depois de centenas de currículos enviados, de dezenas de entrevistas de emprego em que tentámos a custo vender a alma, nasceu a maio maio. Ou, e também por isso: a maio maio nasceu porque chegámos a um ponto em que nos vimos obrigados a costurar a nossa vida, a afirmar a nossa presença enquanto nos descredibilizam e nos esquecem. 


Colhemos os maios, erguemos a bandeira e lutamos.


maiomaio.edicoes@gmail.com





EN

We were born at the dawn of the first day of May (Maio -pt) in Ovar, one of the regions that still maintains a peculiar tradition. It was believed that the transition of the months would coincide with the coming of witches, who would arrive in groups to try and enter local homes. The population protected themselves with the wisdom of mothers, grandmothers, great grandmothers who, generation after generation, would prudently recommend to leave at the entries of the house branches of maios—a plant feared by witches. On this morning we went to the streets with our flag and gathered the few branches that, between being discredited and forgotten, paid homage to the nocturnal passages of those women. As if the disregard to which they were devoted, the medicine that does only good, was now more an affirmation of a presence than a trace of a cruel persecution. 

Our cause is fair: we demand dignity and improved conditions for all.

But it is also strict, comfortable in its orthodoxy. This is why we identify with the history of the branches of maios and we carry these two symbols in our hands. And the reason, too, for our name, maio maio, repeated as if chanted in protest. An attempt to unite our imperfect voices, to find comrades, growing in force and frustration and contributing to what we hope to become a heterodox militancy. 

From hundreds of CVs sent, dozens of job interviews in which we attempt to sell our souls, maio maio was born. But not only this: maio maio was born after arriving at a point in which we were obligated to piece together our lives, affirming our presence in the face of being discredited and forgotten by others. 


We collect the maios, raise up our flag, and fight.



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